A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho – TST, com base no entendimento de que o acordo coletivo não pode suprimir direito amparado em norma de ordem pública, negou conhecimento ao recurso de empresa atuante no âmbito metalúrgico contra condenação ao pagamento de horas extras a um motorista. A decisão condenatória recorrida está fundamentada na invalidade de norma coletiva que previa registro de jornada de trabalho “por exceção”. Assim, os cartões de ponto sem a variação normal de minutos foram declarados nulos como meio de prova.
Embora haja previsão legal para o ponto por exceção (portarias 1.120/95 e 373/2011 do Ministério do Trabalho), o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região entendeu que a obrigatoriedade do registro manual, mecânico ou eletrônico da hora de entrada e de saída dos empregados de estabelecimentos com mais de dez trabalhadores, prevista no parágrafo 2º do artigo 74 da CLT, é norma de ordem pública, e não pode ser suprimida mesmo por meio de acordo coletivo.
Segundo a corte superior, a exigência visa permitir a fiscalização do cumprimento das normas de duração do trabalho, que fica inviabilizada quando a empregadora faz o lançamento automático da jornada contratada, sem a variação normal de minutos.
No recurso ao TST, a empresa sustentou que a norma coletiva é válida e que o artigo 74, parágrafo 2º, da CLT não trata de direito indisponível. No entanto, essa não foi a avaliação do relator do processo, ministro João Oreste Dalazen, nem da 4ª Turma. O magistrado lembrou que o princípio da autonomia privada coletiva (artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição), que autoriza que os próprios interlocutores sociais criem normas, inclusive com a possibilidade de supressão de direitos em prol de algum outro benefício, “não ostenta feição absoluta”.
O relator explicou que as cláusulas negociadas em âmbito coletivo não podem se sobrepor a direitos indisponíveis, como as normas relativas à higiene, saúde e segurança no trabalho e outras relacionadas à própria dignidade humana do empregado, inclusive no caso de dispensar a marcação dos horários de entrada e saída do empregado.
Segundo o ministro Dalazen, com o reconhecimento da invalidade dos cartões de ponto como meio de prova, presume-se verdadeira a jornada informada pelo motorista na petição inicial, nos termos da Súmula 338, item I, do TST, cabendo à empregadora o ônus de invalidar essa presunção, o que não ocorreu.
O atual entendimento do Supremo Tribunal Federal
O STF em duas ocasiões definiu ser constitucional fazer o negociado prevalecer sobre o legislado. O primeiro caso (Recurso Extraordinário 590.415) sob a relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, no qual ele deu ganho de causa a um banco que havia feito acordo no qual quitava dívidas com os trabalhadores que não entrassem na Justiça após o pagamento.
Em outro momento, o ministro Teori Zavascki citou esse precedente estabelecido pelo Ministro Barroso para um caso no qual reverteu a sentença de uma empresa que havia sido condenada a pagar horas extras no Tribunal Superior do Trabalho. E ressaltou que Constituição Federal prevê que as normas coletivas de trabalho podem abordar salário e jornada de trabalho e se um acordo firmado entre sindicato e empresa não passar dos limites do que é razoável, ele se sobrepõe ao que está previsto na legislação.
No entanto, posteriormente, o TST ressaltou que a autonomia negocial coletiva não é absoluta. O entendimento foi firmado em um caso no qual os julgadores disseram que não se aplicava a jurisprudência do STF. Assim, o TST anulou um acordo coletivo que, de acordo com o tribunal, reduzia os direitos dos trabalhadores.
Ref.: Processo 12184-33.2014.5.03.0084.